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Quase Três Décadas Depois: a Morte de PC Farias Permanece um Mistério


A morte de PC Farias e de Suzana Marcolino foi oficialmente tratada como crime passional. No entanto, relatos contestados, vozes misteriosas em gravações, o desaparecimento de provas e a subsequente absolvição de todos os acusados ​​reforçam a ideia de que o caso foi cuidadosamente acobertado de cima.

Na tarde de 22 de junho de 1996, Suzana Marcolino estacionou seu carro em uma videolocadora em Maceió, capital de Alagoas. Ela exibiu orgulhosamente seu novo Fiat Tipo, presente do namorado, com quem mantinha um relacionamento há menos de um ano.

O relacionamento entre Paulo César Farias, o influente empresário que havia sido tesoureiro da campanha presidencial de Fernando Collor de Mello e figura central em um dos maiores escândalos políticos da história recente do Brasil, e Suzana, embora recente, era turbulento. PC Farias já havia contado a amigos que pensava em deixá-la por outra mulher, Cláudia Dantas, por quem afirmava estar apaixonado. As brigas e os ciúmes eram constantes. Na noite do dia 23, PC recebeu o irmão, o então deputado federal Augusto Farias, e a namorada para um jantar com uísque, camarão e vinho.

Na manhã do dia 24, PC Farias e Suzana Marcolino estavam mortos na cama, cada um com um tiro no peito. As conclusões iniciais apontavam para um crime passional: Suzana havia matado PC e, em seguida, tirado a própria vida.

Desde então, 29 anos se passaram. Teorias floresceram. Alguns acreditam que PC sabia demais e foi silenciado para que os segredos da elite nunca viessem à tona.

Outros argumentam que foi um crime passional mal investigado.

O fato é que, quase três décadas depois, a morte de Paulo César Farias e Suzana Marcolino continua sendo uma das maiores e mais polêmicas sombras da história brasileira.

Versão Oficial

Jornal da época noticiava que Suzana matou PC enquanto ele dormia.

Por volta das 16h do dia 24 de junho de 1996, o então Secretário de Justiça, Rubens Quintela, acompanhado do delegado Cícero Torres, dirigiu-se publicamente à imprensa que aguardava informações em frente à delegacia. A versão apresentada foi direta: tratava-se de um crime passional.

Suzana, tomada pelo ciúme e pela dor do abandono, teria matado PC enquanto ele dormia e depois tirou a própria vida com um tiro no peito.

No mesmo dia, o irmão de PC, o deputado federal Augusto Farias, disse estar “satisfeito” com a conclusão das autoridades.

Augusto Farias, 2025.

Cinco dias depois, o Instituto Médico Legal de Maceió divulgou um laudo preliminar reforçando essa hipótese.

Segundo o documento, os dois morreram entre 7h e 9h, e vestígios de pólvora foram encontrados nas duas mãos de Suzana. A arma do crime, um revólver Rossi calibre 38, estava ao lado do corpo da jovem e aparentemente havia sido comprada por ela uma semana antes do crime.

Uma amiga, que intermediou a compra da arma, testemunhou: “Ela foi lá comprar a arma e pediu para testá-la”.

O perito Domingos Tochetto usou um revólver para contestar a teoria do suicídio de Suzana, no Tribunal de Maceió.

A narrativa parecia se encaixar: uma jovem emocionalmente instável e ciumenta, abandonada por um homem poderoso e mulherengo. Ela estava endividada, sua conta bancária registrava um déficit de R$ 15.000 e PC, segundo amigos, não a sustentava mais como antes.

Além disso, havia a dramática história de uma tentativa de suicídio: na noite anterior ao crime, Suzana se jogou no mar em frente à casa de Guaxuma, gritando que queria morrer, e foi salva por um dos seguranças.

Dois meses depois, para reforçar ainda mais a versão oficial, o renomado perito criminal Fortunato Badan Palhares, professor da Unicamp, foi chamado para analisar o caso.

Após analisar os documentos e a cena, Fortunato confirmou:

Eu não tenho dúvida nenhuma do que aconteceu: foi um assassinato seguido de suicídio. A nossa conclusão é que Suzana matou PC e se suicidou. Não há possibilidade, pelos elementos levantados, de existir uma terceira pessoa envolvida nesse caso

No entanto, a narrativa oficial começou a ruir quase tão rápido quanto foi construída.

Começaram a surgir reportagens em jornais e revistas questionando a cronologia apresentada, a posição dos corpos, a ausência de respingos de sangue no local do tiro fatal de Suzana e o fato de a porta do quarto estar trancada por dentro, apesar dos cartuchos encontrados do lado de fora.

Peritos independentes, peritos forenses experientes e investigadores aposentados começaram a se reunir em diferentes regiões do país para analisar o caso sob uma perspectiva técnica e imparcial.

O resultado foi uma onda de desconfiança que contaminou a opinião pública e colocou as investigações sob os holofotes do ceticismo.

Duplo Homicídio?

Paulo César Farias era mais do que um empresário influente: era uma espécie de caixa-preta humana da corrupção brasileira. Na época de sua morte, respondia a 142 processos e dava sinais públicos de que pretendia quebrar o silêncio. Chegou a declarar que escreveria um livro revelando as fraudes políticas de bastidores das quais participou e, mais alarmante, estava prestes a depor perante uma CPI.

Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é uma investigação conduzida pelo Poder Legislativo, que transforma a própria casa parlamentar em comissão para ouvir depoimentos e tomar informações diretamente. Na esfera municipal seu nome correto é Comissão Especial de Inquérito (CEI)
– Wikipedia

A oportunidade de silenciá-lo para sempre surgiu em junho de 1996.

A versão oficial logo começou a ruir diante de um dos contra-ataques mais emblemáticos: o laudo de George Sanguinetti, professor de medicina legal da Universidade de Alagoas, que desmantelou ponto por ponto a teoria do homicídio seguido de suicídio.

O ponto central da disputa era surpreendentemente simples: a altura de Suzana Marcolino estava errada.

A investigação oficial alegou que ela tinha entre 1,65 m e 1,67 m de altura, medida que permitiria que o tiro tivesse sido direcionado ao seu próprio peito. No entanto, Sanguinetti afirmou que ela era visivelmente mais baixa do que PC Farias, que tinha 1,63 m de altura.

Confirmada por um perito da Unicamp, a verdadeira altura de Suzana era de 1,57 m, dez centímetros a menos do que o declarado no laudo original.

Badan Palhares disse ontem à Folha que não tinha conhecimento do novo laudo e que não vai comentar o caso. 'Não tenho que me manifestar sobre isso. Só vou me manifestar em juízo. Esse é um problema dele (Figueiredo) com a Secretaria da Segurança Pública de Alagoas', afirmou.
Figueiredo não quis opinar sobre o que o novo documento pode determinar nas investigações sobre a morte de PC.
Em relação a Palhares, Figueiredo disse que 'ele agora deve se explicar à Justiça'. 'O que mais me impressiona é como alguém (Palhares) trabalha com isso há vários anos e não perceba a diferença', afirmou Figueiredo
– Folha de São Paulo, Novo laudo revê altura da namorada de PC

Outros detalhes reforçaram a suspeita.

A arma não estava pressionada contra o peito, como acontece em suicídios, mas a 20 centímetros de distância.

Fato perturbador: não foram encontradas impressões digitais no revólver.

O tiro em PC também levantou suspeitas. Sanguinetti foi categórico:

Crimes passionais não têm apenas um tiro

Esses elementos formaram um novo dossiê submetido à Justiça em 1999, assinado por quatro peritos de renome nacional. Três anos após o assassinato, peritos ainda se reuniam por iniciativa própria em todo o país, movidos pela sensação de que algo não batia certo. A verdade é que o que aconteceu em Guaxuma naquela manhã de junho de 1996 talvez nunca seja totalmente explicado.

Fatos Estranhos

Nas primeiras horas da manhã do crime, Suzana usou o celular pelo menos três vezes, às 3h54, 4h57 e 5h01 da manhã, para deixar mensagens emocionadas ao dentista Fernando Colleoni. Uma delas dizia:

Tenho certeza que vou lhe encontrar em algum lugar

As mensagens eram tão perturbadoras que, ao saber das mortes, Fernando entregou voluntariamente as fitas da secretária eletrônica à polícia. A parte mais perturbadora, porém, acontece no final da última ligação: ao fundo, ouve-se uma voz masculina sussurrando para Suzana.

O que você tá fazendo? Te arruma, te arruma

O perito forense Ricardo Molina identificou claramente a voz masculina nesta última mensagem. Sugere-se que PC Farias já poderia estar morto enquanto Suzana ainda falava ao telefone.

Não faltaram tentativas de silenciamento. O promotor Luiz Vasconcelos, responsável pelo caso, recebeu ameaças diretas de arquivamento do inquérito. Uma delas ocorreu durante uma reunião com a cúpula da segurança pública:

Disseram que me matariam se eu seguisse com a investigação

O laudo oficial, assinado por Fortunato Badan Palhares, sempre sustentou a tese de homicídio seguido de suicídio. No entanto, investigações apontam para outra história: a de um crime encomendado, acobertado por interesses superiores. Badan foi acusado de vender sua conclusão por R$ 400 mil, segundo depoimento prestado pelo ex-governador Geraldo Bulhões à CPI do Narcotráfico.

A CPI do Narcotráfico reforçou ontem a suspeita de que o legista Fortunato Badan Palhares fraudaria laudos sob encomenda e de que seria o perito de uma quadrilha do crime organizado.
Em mais de 7 horas de depoimento à comissão, Badan reconheceu erros e 'infelicidades':
1) Disse ter se arrependido por dois laudos que assinou -afirmou não se lembrar a que casos se referiam;
2) que, para não onerar 'uma família pobre', não pediu exame de DNA para identificar um corpo que poderia ser o de um adolescente morto pelo crime organizado no Maranhão;
3) que desconsiderou em 1987 a posição de um revólver ao atestar o 'suicídio' do vice-governador eleito da Paraíba Raymundo Asfora, cuja morte foi considerada assassinato pela Justiça;
4) que, 'infelizmente', se esqueceu de citar a altura de Suzana Marcolino no laudo do caso PC Farias;
5) que manteve por 11 anos em seu laboratório particular equipamento da Unicamp, universidade da qual é professor.
6) e que, 'infelizmente', a polícia de Campinas não abriu inquérito para investigar 51 fotos de necropsias (inclusive de PC Farias e Suzana Marcolino) encontradas na cidade, simplesmente devolvendo o material a Badan.
Depois de chamar o legista de 'mentiroso', deputados disseram que estudam seu indiciamento por falsa perícia, falsidade ideológica e formação de quadrilha
– Folha de São Paulo, CPI ouve Badan e reforça suspeita contra legista

A CPI começou a suspeitar que Augusto Farias, irmão de PC, poderia ser o mandante do crime.

Conclusão

O caso do assassinato de Paulo César Farias e Suzana Marcolino terminou sem solução. Augusto Farias, irmão de PC e suposto mandante, teve seu caso arquivado pelo Supremo Tribunal Federal em 2002, graças ao seu foro privilegiado.

Os quatro seguranças que estavam na casa no dia do crime só foram levados a julgamento por júri em 2013. Embora os jurados tenham reconhecido que se tratou de um duplo homicídio, os réus foram absolvidos por leniência. As tentativas de anulação do julgamento fracassaram, e a sentença foi mantida em 2019. Para o legista George Sanguinetti, o caso simboliza a impunidade no Brasil: as provas foram ignoradas e a pressão de cima sufocou as investigações.

Assim, o caso Guaxuma tornou-se mais do que um mistério criminal: um retrato da falência institucional diante do poder. Mais uma vez, a elite venceu e demonstrou que está acima da lei.


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